domingo, 29 de junho de 2008

Concessão de comenda

Ato continuo à criação da comenda "São Pio X", decido, conforme consta do art. 2º, conceder o referido título à senhora Vanda Lemos, pelas razões a seguir expostas:

A senhora em questão tem 62 anos e na noite de sexta-feira (27) matou com três certeiros tiros dois assaltantes que se preparavam para roubar seu estabelecimento comercial. Com eles a polícia encontrou algemas, luvas cirúrgicas e cordas.

Com tal ato de bravura ela contrariou a mentalidade modernosa que prega a não-reação e exercitou seu sagrado direito à legítima defesa, merecendo assim a comenda recém criada.

Aproveito para fazer uma menção honrosa ao vizinho da dona Vanda que declarou: "É uma situação difícil, mas acho que ela fez o certo. Se ela não os matasse, poderia ter sido morta.".

Infelizmente, porém, tenho que criticar a polícia, para quem vai mais do que uma menção desonrosa. A Dona Vanda mesmo chamou as autoridades policiais, mas elas furtaram a arma da pobre senhora. Se ela for visitada por mais alguém mal-intencionado não poderá se defender. Compreendo que haja uma lei imoral que exige uma pá de bobagens para que ela pudesse portar a arma, mas os policiais poderiam ter aliviado.

A notícia está aqui.

Quer saber mais sobre essa pacividade modernosa, também conhecida como sitting duck (aqueles patinhos de tiro ao alvo)? vá aqui.

E você policial, que entende a moralidade da ação da senhora mas tem que se equilibrar em leis pouco morais ou mesmo imorais, quer saber mais sobre a contraposição das duas? vá aqui.



"tuu totus ago sum, et omnia mea tua sunt"

comenda "São Pio X"

Decreto nº1

Através do presente ato instituo a comenda "São Pio X", cuja concessão seguirá as regras a seguir:

art.1º - A comenda "São Pio X" será concedida, na forma legal, a todos aqueles que praticarem, direta ou indiretamente, atos contra a mentalidade moderna, não importando o alcance e as justificativas usadas.

parágrafo único - a concessão da referida comenda não importa em nenhum reconhecimento outro que a oposição do ato particular à mentalidade comum da modernidade, não abonando quasquer motivos, justificativas, ou outros atos do autor, salvo se o ato de concessão expressamente mencionar.

art.2º - A comenda será concedida somente por ato soberano do administrador deste blog, podendo ser cassada a qualquer tempo.

art.3º - Os atos anti-modernos a serem agraciados poderão ser indicados por qualquer visitante deste blog, passando, entretanto, pela avaliação do administrador, conforme preceitua o art. 2º.

parágrafo único - a indicação poderá ser feita por qualquer meio desde que conte com indicação da fonte através de link.

Dado em Vitória, 29 de Junho de 2008.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

sexta-feira, 27 de junho de 2008

da coleção "deixando as coisas bem claras" - III

Ontem 26 de junho, foi dia de São Pelágio, mártir aos 13 anos em 925.

Ele foi aprisionado pelos mouros e o emir Abderramão III tentou seduzi-lo, sendo então repelido por São Pelágio que, indignado, respondeu:

"Afasta-te, cão! Pensas por acaso que sou um dos teus efeminados lacaios?"

Não deixou dúvidas... foi cortado em pedaços, tendo os braços e os pés arrancados, e por fim foi decapitado e lançado a um rio.

São Pelágio, ora pro nobis.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Mais MST


Ontem eu falava da ação que o Ministério Público do RS parece estar tomando face as badernas do MST. Postei com base só na notícia que li no UOL.

Hoje, como estava devendo umas visitas ao blog Paz no Campo (blog do princípe D. Bertrand de Orleans e Bragança) resolvi dar uma passada lá. Devia ter feito isto ontem, teria me poupado um tempo. Lá tem não só a notícia da tal ata como a própria, scaneada, além de várias outras boas notícias vindas das terras gaúchas.

D. Bertrand tem acompanhado há muitos anos a questão, além de ser preparadíssimo e um grande estadista, recomendo, então, a visita e a adição do blog nos favoritos para quem se interessa sobre a questão agrária.

Ah sim, antes que perguntem... sou monarquista sim, mas isso é questão para outro post, um outro dia, quem sabe.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Enquanto isto, nos outros blogs

"O que é mais curioso nesta tragédia humanitária toda é notar como o direito ao aborto, que na ideologia feminista existe para defender os direitos da mulher, está ele mesmo a dizimar os direitos da mulher. No afã de um igualitarismo irrestrito e de direitos femininos ilimitados ao próprio corpo, vai-se conhecendo a maior discriminação prática à mulher que já se ouvir falar, àquela aonde não lhes foram concedidas nem o direito a própria existência."

O Cultura da Vida demonstra como é imbecil o argumento segundo o qual o aborto é um passo para a valorização da mulher na sociedade. Na Índia o aborto tem levado a uma queda impressionante do número de meninas.

Recomendo vivamente a visita e a leitura da notícia.

Em tempo, O Possível e o Extraordinário também chamou atenção para o Cultura da Vida. Não há cópia minha neste caso, há semelhante estupefação.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

Será que alguém vai, finalmente, peitar o MST?


Acabo de ler que o Ministério Público do Rio Grande do Sul aprovou um relatório em que se propõe a dissolução dessa quadrilha. A ótima notícia pode ser encontrada aqui.

Segundo o relatório os motivos são os seguintes:

1- adoção de táticas de guerrilha (essas badernas, sabotagens, destruição da coisa pública e privada ultrapassam o propósito de um movimento social);

2- o objetivo não é a reforma agrária (as áreas ocupadas são escolhidas estrategicamente, como terras produtivas ao lado de um pólo petroquímico e próximo a redes de alta tensão);

3- o movimento é uma máscara para ações ilegais (não existe como pessoa jurídica, mas recebe recursos públicos através de seus braços financeiros, a Anca e a Concrab);

4- é uma organização criminosa (se os atos que são praticados pelos seus fossem praticados por qualquer pessoa de fora elas seriam punidas... experimente o leitor entrar em uma repartição do incra sozinho e sair quebrando tudo, ou entrar em uma faculdade e destruir pesquisas de décadas... pelamordedeus, essa frase foi meramente retórica, não saiam quebrando nada :-));

Resta saber se a coisa vai andar, se alastrar pelo país e servir de exemplo para ações semelhantes contra outras quadrilhas do gênero, como a Liga dos Camponeses Pobres, p.ex. Dúvido muito, mas rezemos.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

terça-feira, 24 de junho de 2008

Viver é difícil

Mas espera um pouco, quem falou que seria fácil? Viver envolve sempre, como venho dizendo, o relacionar-se com o outro, outro que, falando de uma maneira geral, em algum momento das nossas vidas nesse vale de lágrimas não corresponderá àquilo que apostamos nele e, muitas e muitas vezes, nos decepcionaremos. Essa é uma verdade universal da condição humana.

Mas se sempre foi assim nem sempre o sofrimento vindo da decepção alcança o mesmo grau nas pessoas, como não causa o mesmo efeito um mesmo sacrifício em dois indivíduos diferentes. Se, portanto, é fato que nos decepcionamos, é também fato que os espíritos sofrerão de acordo com suas esperanças. Espíritos mais fortes agüentam mais, os mais fracos ou enfraquecidos pouco.

Neste sentido creio que nós que vivemos nesses dias levamos séria desvantagem sobre nossos antepassados. Explico: Por uma série de razões que seriam longas demais para explicar aqui, somos criados hoje como se tudo girasse em torno dos nossos umbigos, somos o centro do Universo (agora mesmo vi uma propaganda que dizia exatamente isto, infelizmente não me recordo qual era a empresa, acho que uma automobilística). Isto pode parecer legal para alguns, mas o resultado é que cada acontecimento ruim de nossas vidas se torna uma catástrofe de dimensões cósmicas, de forma que quando nos deparamos com uma decepção maior tudo, absolutamente tudo, parece perder o significado, o que acaba levando, em alguns casos, ao suicídio.

Nossa criação (e é evidente que existem exceções) não nos permite só ficarmos tristes com nossas decepções, faz com que fiquemos também miseráveis, porque achamos que isso só acontece conosco. Como isso pode acontecer comigo, logo comigo, sempre comigo? Deus não gosta de mim, sou a pior das pessoas!

Um amigo, cujo nome guardo como uma espécie de segredo de confissão, me contou certa feita que em determinado momento de sua vida sofreu muito por uma tremenda decepção com alguém em quem tinha, por assim dizer, apostado alto. Estava miserável. Ele me contou, ainda, que só saiu desse estado depois que um amigo, padre, lhe disse: "Mas escuta meu filho, todo mundo sofre!" (evidentemente não com essas palavras :-)) , permaneceu triste, mas não miserável, continuou vivendo. E não é um caso único, eu mesmo, lendo sua autobiografia, já "escutei" de Santa Teresinha do Menino Jesus: "Mas ô filhinho, todo mundo sofre!" (repararam a delicadeza!? Ela é uma doçura mesmo:-)).

Mas estas são exceções, sortudos que encontraram quem lhes tirasse da ilusão de serem mais importantes do que verdadeiramente são. O mundo moderno não quer saber se todo mundo sofre, não dá para fazer comparações quando alguém é o centro de toda realidade. Assim, para evitar a miséria, ele cria algumas regras para afastar as pessoas, para evitar choques, para evitar decepções, mas que acabam tirando o melhor da vida, a Caridade.

Para os que gostam das minhas introduções tenho o prazer de informar que acabam de ler uma, segue um trecho do livro "A Descoberta do Outro" do Gustavo Corção:

"O mundo é triste por causa da Caridade. Quando, num clarão de amor, reconhecemos o outro, no amigo ou na noiva bem-amada, toda nossa alma canta um aleluia, e dentro de nosso coração nos sentimos salvos. Estamos salvos. Agarramo-nos àquela tábua, seguramos o braço que se estende, abraçamos, beijamos, e com lágrimas de alegria, com gratidão de amigo ou de noivo feliz, repetimos dentro de nós o mesmo cântico dos cânticos: estamos salvos! O encontro na amizade e no amor nos livra da escuridão, da solidão, nos livra de sermos nós, cada um de nós, o centro solitário de um universo vazio e ruidoso.

Mas o mundo é triste por causa da Caridade, sem ela seria seco como a cinza, mas não seria triste. Logo depois do encontro vêm as decepções, e quando começa logo se multiplicam. Uma puxa a outra. As pessoas que se julgam razoáveis pasmam diante do sofrimento atroz que a falha do próximo nos traz; escarnecem o exagero da dor como já tinham escarnecido o exagero do amor. E essa meia sabedoria usa as palavras dos salmos: 'É infeliz quem confia nos homens...' Mas ainda é mais infeliz quem não confia!

É realmente incrível que alguém confie em alguém; que casais se casem; que amigos andem juntos sem olhares oblíquos para os gestos que o outro faz; tudo isso é incrível porque a experiência milenar demonstra que esse fenômeno é transitório e que a decepção é a verdadeira regra desse mundo. E quando chega essa hora em que o mundo tem razão, quando perdemos um amigo num mal-entendido e vemos o velho rosto, conhecido entre mil, crispar-se de má vontade, ficar duro de rancor, ou quando a lividez cobre devagar a face de uma esposa, então nos sentimos perdidos... Salvos há pouco; perdidos agora. Apostáramos demais.

Poucos dias correram entre o momento de salvação e a hora do desespero, e esses poucos dias foram mal empregados. Logo depois do clarão do primeiro encontro passamos a morar no convívio das sombras, no regime triste e monótono dos cachações.

O mundo nos aconselha a não crer no amor. Será um epifenômeno, uma mentira das glândulas; uma ressonância de opiniões; uma concordância de peles e cheiros. Aparecem pedagogos e sociólogos pedantes para nos propor uma solidariedade de camaradas humanos na base de uma tolerância que respeita tudo no outro, exceto o que ele é. Para evitar os cachações dos muitos corpos atirados no estreito vale de lágrimas, instituem-se regras especiais de bem-viver, regulamentos, leis sociais, boas educações, moral, civismo, para que as sombras circulem na caverna escura sem atritos demais e saibam dizer umas às outras: 'Com licença, com licença...'

A reconciliação que a prudência do século nos propõe baseia-se no artifício, na tática, na tolerância, no respeito às opiniões; baseia-se no desconhecimento do próximo. Quantas vezes já ouvi conselhos ditados da piramidal altura dessa meia sabedoria a jovens casais que se desavêm! Damas conhecidas e homens, cavalheiros espertos em conveniências ensinam que tudo se obtém do próximo à custa de uma habilidade especial em desviar o ombro para evitar a cachação. Nos jornais, as seções dedicadas às mulheres são infalivelmente arquitetadas com sentenças da mais moralizadora pornografia. Tudo são preceitos de esperteza feminina, manobras para conseguir em casa a perfeita harmonia.

O mundo está cheio de conflitos, é um campo de batalha ininterrupto e um pátio de misérias sem fim: mas a pior coisa do mundo ainda é a sua reconciliação"

(Gustavo Corção in "A Descoberta do Outro", Agir, 10a. ed., p.186-187, os grifos são todos meus)



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

sábado, 21 de junho de 2008

Agradecimento

Tenho que agradecer publicamente meu irmão Wagner, do "O possível e o Extraordinário" pelo post "Tempos Interessantes". Não é dirigido a mim. Aliás, longe de mim, tão pequenino no meio de tantos gigantes, no meio de tantos outros irmãos tão queridos que se doam pela Igreja.

Agradeço por ter tocado meu coração nessa tarde de Sábado. Deus sabe quanto lhe sou grato meu irmão. Não por qualquer coisinha insignificante, mas por ter me lembrado que pertenço à Igreja. Deus seja louvado.

Não serei tão desapegado quanto você, colocarei o vídeo que você descobriu no blog Fidei Depositum aqui nesse bloguinho, que deve tanto ao seu e aos outros.




Ah, Santa Madre Igreja meu coração é todo teu! Se pedires minha vida, ainda que indigno, pela graça de Deus ela será tua!

Ah, Santíssima Virgem, "TUU TOTUS EGO SUM, ET OMNIA MEA TUA SUNT"!!!!

Mais rumores


Lembram que eu comentei aqui que existem boatos sobre uma possível conversão do Bush?

Pois bem. Agora foi a vez dele visitar o Papa, que retribuiu a gentileza do presidente americano (que foi buscá-lo na porta do avião) encontrando-o fora de seu palácio. Nesta oportunidade vários jornais, inclusive brasileiros, publicaram matérias sobre os tais rumores de conversão. Vamos ficar atentos e rezar.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

sexta-feira, 20 de junho de 2008

Para não dizerem que sou fã do Calvin

Lembram do post do Haroldo ensinando o que é se apaixonar?

Pois bem. Usando mais uma vez das minhas prerrogativas de rei do blog, segue mais uma aula. Mas não do Calvin & Haroldo, ou começaram a espalhar um boato de que sou fã, e sim das Galinhas Selvagens (Savage Chickens).



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Ainda Uganda, ainda que quase sem Uganda desta vez.

No post passado escrevi o seguinte:

"É por tudo isto que a opção pela simples distribuição de preservativos sempre me parece mais uma preocupação ideológica de manter, e fomentar, certas "liberdades", certos anti-valores modernos, do que propriamente uma preocupação com número de vidas poupadas."

Alguém poderia objetar: "mas não é exatamente isto que a Igreja faz tio? Fechar os olhos para a realidade em nome de certos valores morais, condenando muitas pessoas à morte?"

Vamos por partes.

Primeiro. Não há problema algum em nortear as atitudes por certos valores, este é, aliás, o ideal. O problema é quais são os valores escolhidos. Por isso, quando escrevi ontem coloquei liberdades entre aspas e disse que a preocupação era manter certos anti-valores, ou seja, valores contrários à moral.

Aqui é engraçado reparar que realmente esta é uma acusação quase sempre lançada sobre a Igreja, sem que quem a lance perceba que por trás da escolha que ele mesmo fez há uma opção fundamental, tão decisiva quanto aquela feita pela Igreja, embora não tão segura.

Mesmo quando se opta por agir contra o que se considera um "moralismo", por trás desta ação está, justamente, uma outra "moral", uma anti-moral. O mesmo ocorre, p.ex, quando se defende que o Estado é laico e que, portanto, não deve se basear na moral cristã. Uma escolha nesse campo, mesmo que negativa, mesmo que apenas se declare "não-cristã" é já uma opção positiva, é já a escolha de uma outra base valorativa, nunca será neutra como pretendem alguns.

O racionalista moderno, como é o caso de um "cientista" como Richard Dawkins, p.ex, toma suas decisões "neutras" com base em um princípio que não pode ser provado pelas ciências, o de que a realidade se resume àquilo que pode ser experimentado, testado, reproduzido em laboratório. Ora, essa afirmação é de ordem metafísica, não pode ser testada, não pode ser experimentada, nem muito menos reproduzida em laboratório. Deixa-se a moral cristã em prol de uma outra que, a seu jeito, também valora as ações humanas.

Quando digo, portanto, que o programa brasileiro parece mais uma preocupação ideológica de fomentar certos princípios "morais", o problema não está ai, mas está sim nos valores escolhidos, mesmo que, como já disse, sob a máscara de uma neutralidade, ou de uma "laicidade" Estado.

Segundo. A Igreja não fecha os olhos para a realidade, ao contrário, ela a encara em sua completude, levando em consideração não só a realidade experimentável, mas também aquela metafísica. O homem é visto, então, em sua totalidade, não só no aspecto material, mas também no espiritual, no sentimental, no psicológico.

Terceiro. Ao fazer isto a Igreja não condena ninguém à morte, ao contrário, ordena as vidas para que tenham significado pleno e se salvem.

O resultado é, como aconteceu em Uganda, vidas poupadas, fazendo com que a lógica baseada na tal moral "neutra" vire pó, como narra o blog Pé na Africa. Para facilitar cito um trecho:

"Hoje conversei com representantes de duas ONGs, esperando ouvir algumas críticas à política do ABC. Nada. Aprovam 100%. Há um consenso nacional em torno do tema. Sobra para organizações estrangeiras descerem o pau, dizendo que é irreal esperar que um jovem de 20 anos se mantenha virgem.

Mas os números estão aí, desafiando o que diz a lógica e a convicção de muitos (como eu). São um tapa na cara dos céticos."

Preocupação com vidas plenas que a moral governamental não parece ter, ou pelo menos faria uma auto-crítica diante do que está acontecendo, mais vidas sendo salvas lá do que cá.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

terça-feira, 17 de junho de 2008

Prioridades

As vezes fico me perguntando: qual será a verdadeira preocupação desse pessoal que promove o combate a AIDS através da simples distribuição de preservativos?

A primeira vista são todos bem intencionados, todos desejam salvar vidas, ou não? Seguindo a lógica que é propagandeada o único intuito é salvar vidas, é brecar a disseminação da AIDS, certo? Pois então por que a realidade não importa para esses senhores? Por que o contundente exemplo de Uganda não causa nem um cisco de questionamento do programa brasileiro, mas, ao contrário, é quase ridicularizado como "moralista"? Então a intenção primeira não é salvar vidas, não é derrotar a AIDS, mas só permitir que as pessoas continuem promíscuas com o menor risco possível?

É por tudo isto que a opção pela simples distribuição de preservativos sempre me parece mais uma preocupação ideológica de manter, e fomentar, certas "liberdades", certos anti-valores modernos, do que propriamente uma preocupação com número de vidas poupadas.

Pesquisando achei mais uma possível resposta às perguntas acima, um texto do Olavo de Carvalho que trata justamente do exemplo de Uganda e da crítica feita por um enviado da ONU. O texto é de 2005 e é muito grande para colocar aqui, mas recomendo fortemente a visita.


"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

A lógica furada do (des)governo brasileiro.

Quem ai acha o programa brasileiro de combate a AIDS um sucesso levante a mão (o pessoal da ONU ai no fundo nem precisava)... Agora quem prefere o de Uganda levante as mãos (o pessoal ai com esse chapeuzinho engraçado na cabeça já pode baixar).

Não está entendendo nada? leia a notícia abaixo, depois eu volto:


O Papa elogia política de Uganda para combater o AIDS

.- Em uma mensagem dirigida ao novo Embaixador de Uganda ante a Santa Sé, Nyine S. Bitahwa, o Papa Bento XVI elogiou a política para prevenir a transmissão do VIH/AIDS do país africano que, contrariando as imposições da ONU que exigem promover o sexo livre e o preservativo, obteve o índice mais bem-sucedido de redução da difusão da pandemia mediante a promoção da fidelidade e a abstinência.

No discurso escrito que entregou esta manhã, o Pontífice elogia a Uganda "os frutos nos setores da educação, o desenvolvimento e a sanidade, sobre tudo na luta contra o AIDS, assim como a atenção emprestada aos afetados e a afortunada política de prevenção apoiada na continência e a promoção da fidelidade no matrimônio".

O Papa elogia também a Uganda pela "culminação do esforço para formalizar acordos de paz que põem fim a longos anos de guerra marcados por uma violência cruel e insensata" e auspicia que "todos os refugiados retornem logo a seus lares para reatar uma existência pacífica e produtiva".


Voltei. Pois é, o tão "respeitado" programa brasileiro consegue, no máximo e com custos altíssimos, deixar tudo igual, já o de Uganda conseguiu baixar a população afetada de 8% para 5%, em três anos (há 15 anos a taxa era de 30%). É o menor entre os países africanos.

Qual a fórmula do sucesso?? ao invés de distribuir preservativos eles incentivam a abstinência e a fidelidade conjugal. Abaixo alguns exemplos de propagandas usadas lá em Uganda:



E então, distribuir camisinha é a solução??? Uganda vem provando que a lógica dos nossos governantes pode ser até perfeita no papel, mas falha quando encontra a realidade.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

Providência e Paternidade

"(...) Essa paternidade divina é o fundamento da irmandade dos homens: são irmãos por serem filhos do mesmo Pai; suprimindo-se isto, elimina-se o fundamento da fraternidade. Há dois séculos se insiste tenazmente na noção de fraternidade, ao mesmo tempo que se elimina sua justificação. Não se trata de mera 'semelhança', que não basta para estabelecer um vínculo fraterno. A semelhança não é total nem necessária. As diferenças entre os homens são múltiplas, e freqüentemente ocupam o primeiro plano da atenção. A humanidade se apresenta dividida de mil maneiras, diante de diferenças que podem conduzir À exclusão, ao desprezo, ao ódio. A história é um catálogo interminável destas atitudes.

O que não são, não podem ser, é cristãs. Brotaram mil vezes entre cristãos, às vezes 'como tais', mesmo ainda em nome do cristianismo, mas nem por isso deixaram de ser infidelidades gravíssimas e profundas.

A garantia do amor prévio de Deus a todos os homens como filhos é o fundamento da irmandade entre eles e da exigência do amor mútuo. O cristianismo estabelece um vínculo radical entre todos os homens, sem desconhecer sua variedade, suas diferenças. O Novo Testamento está cheio de referências a essa diversidade, de origem, ou povo, sexo, condição social. Reiteram-se as enumerações dessas diferenças, precisamente para superá-las, sem anulá-las nem desconhecê-las, pela superior unidade da fraternidade, isto é, da comum filiação em relação a Deus.

A 'fraternidade' abstrata e vazia, baseada em uma semelhança que não é plena nem suficiente, tem sido corrompida pela falsidade, e por isso não impediu o ódio entre os supostos 'irmãos'. Mas, e entre os cristãos? O cristianismo reconhece, é preciso salientar, as diferenças, as oposições, as lutas. Há referências explícitas aos 'inimigos': pode havê-los, há que contar com eles. Não há irrealidade nem utopismo na revelação cristã.

O mandamento do amor ao próximo significa que todos os homens, sem exceção, são próximos, pela filiação comum do mesmo Pai. Também os inimigos? Certamente: a inimizade não exclui a irmandade: os inimigos o são somente até certo ponto. A fórmula poderia ser: apesar de tudo.

Toda hostilidade, da parte do cristão, tem que ser penúltima. A fórmula adversus hostes aeterna auctoritas não é cristã. Entenda-se bem: não é somente a hostilidade 'entre cristãos' a que tem que ser penúltima, mas a de cristãos ante outros homens quaisquer, ante outros irmãos. A Fórmula tradicional - e admirável - 'paz entre os príncipes cristãos', que autorizava a luta contra os infiéis, devia estar sujeita à limitação de toda hostilidade entre homens.

A hostilidade, ainda que seja inevitável e justificada - por exemplo, ante a agressão -, pode e deve cessar tão logo seja possível. Não pode ser 'implacável'. Por outro lado, deve ter limites em seu conteúdo; a ninguém se pode desejar a condenação, por 'provável' que possa parecer. São conseqüências inevitáveis de ver Deus como Pai."

Julián Marías - "A Perspectiva Cristã" (ed. Martins Fontes, 1a. edição, pp. 42-44)



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

sábado, 14 de junho de 2008

Não atendendo a pedidos

Passou o dia dos namorados. Não fiz o post-clichê, mas acabei citando uma tirinha que tinha lido. Ninguém pediu para ver o tal quadrinho mas vou colocá-lo mesmo assim, portanto, não porque alguém tenha pedido, mas porque eu quero, e acontece que até que um hacker invada meu blog, ou que o servidor resolva ocupar meu espaço com coisa mais interessante, eu sou o Rei por aqui, logo, meu desejo é uma ordem (para mim mesmo, que, felizmente, sou meu único súdito) :-).

Bom final de semana a todos.... e para não dizer que tenho sido um tirano indico mais um blog, que passa a fazer parte das minhas recomendações. Filosofando. Está apenas começando, mas promete fazer alguns questionamentos importantes.

Senhoras e senhores: Calvin e Haroldo.


"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

quinta-feira, 12 de junho de 2008

e no meio do dia havia um Camões

Estava aqui pensando: "será muito clichê fazer um post para o dia dos namorados?". Acho que sim, por isso não farei. Aliás, eu me meteria a divagar sobre o que é amor e o post acabaria perdendo o propósito.

Na verdade cheguei a achar uma tirinha em que o Haroldo explicava para o Calvin o que é o amor, é engraçada, mas verdadeiramente não explica o que é o amor entre um homem e uma mulher e sim o que é o apaixonar-se... coisas muito diferentes. Gustavo Corção diria que esta é só a primeira fase disto que é amor.

Mas vá lá, se me calo deixo ao menos uma poesia, um soneto. Senhoras e Senhores: Camões:

***

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho, logo, mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.

Mas esta linda e pura semidéia,
Que, como o acidente em seu sujeito,
Assim com a alma minha se conforma,

Está no pensamento como idéia;
E o vivo e puro amor de que sou feito,
Como a matéria simples busca a forma.

***


Um pouco de filosofia deixa ainda mais bonita a metáfora dos tercetos finais. O Acidente segundo a filosofia aristotélica/tomista não tem existir sem a substância, sem o sujeito, há, portanto, uma dependência, digamos, essencial, entre aquele e este. Da mesma forma, a matéria simples, a matéria prima, não é, não existe, sem uma forma que a atualize. Assim, a matéria simples "busca" a forma para ser, para existir. Tal é a profundidade daquilo que o autor está cantando.

Mas sei lá, acho que meu comentário acaba de estragar o post :-).



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

segunda-feira, 9 de junho de 2008

O Outro - Parte II

Cumprindo minha promessa, segue a segunda parte do artigo.

***

Eu dizia, na primeira parte dessa reflexão, que toda e qualquer pessoa é-com-outros, com eles forja sua identidade e vive, toma decisões, se relaciona, adquire responsabilidades, etc.

Evidentemente, as poucas linhas que escrevi naquela oportunidade não foram suficientes para esgotar o assunto, nem tinham tal pretensão aliás, mas julgo que já serviram como uma pequena introdução para a análise das implicações desse ser-com-o-outro.

Antes, porém, gostaria de levantar um outro ponto.

Qualquer crença que pregue a criação do universo por um Ser Absoluto, Ele mesmo incriado, ou seja, um Ser não submetido à qualquer princípio ou outro ser à Ele anterior ou superior, um Ser fora do qual nada é, ilimitado portanto, aceita, por conseqüência lógica, que esse Ser criou tudo o que há a partir de sua própria “vontade”, sem qualquer limite a Ele exterior.

A não ser, portanto, que esse Deus houvesse “desejado” criar todo o universo e, após isto, permanecer “fora” dele apenas sustentando sua existência (já que o universo criado jamais poderia ser sem o Ser de Deus, ou teríamos, então, dois seres Absolutos), podemos afirmar que Ele atua na sua criação sem qualquer limite, salvo aquele mesmo que o moveu a tirá-la do nada, sua “vontade”. Deus será, para essas crenças, portanto, o Deus do impossível.


Neste ponto, a fé cristã, por revelação divina, diz isto categoricamente. (Lc 1,37; Lc 18,27; Mc 10,27, etc.).

Tudo isto me serve, em um primeiro momento, para ressaltar que Deus poderia ter “escolhido” caminhos diversos para o homem. Poderia ter optado, p.ex., por trazê-lo ao mundo já com toda a ciência de que precisaria, ou sem passar pela concepção e o nascimento, ou ainda por se revelar à cada um pessoalmente.

Entretanto, não foi este o caminho escolhido por Deus. Como podemos notar em nossas próprias vidas e como a história nos comprova a opção foi por “utilizar-se” dos homens. Assim, agora já na percepção da Revelação, não foi a todos os indivíduos do povo judeu que Deus disse diretamente para sair do Egito para a terra prometida mas os fez escutar e seguir Moisés. Da mesma forma, Deus não colocou na cabeça de cada recém-nascido todos os costumes e leis de Israel mas os fez transmitir por seus pais que, por sua vez, já haviam recebido de seus avós e assim sucessivamente.

Mas talvez nenhum exemplo seja mais eloqüente do que a encarnação do Verbo de Deus. Jesus, sendo Deus, veio ao mundo em uma família, teve pais e a eles se submeteu, frequentou o templo, cumpriu as leis, aprendeu a lingua e costumes do seu povo e ensinou sua palavra de Vida, não de forma sobrenatural mas usando um instrumento comum a qualquer humano, a boca.

Aqui, porém, devo fazer uma ressalva. Ao dizer que Deus escolheu "usar" as pessoas e que cada "eu" é necessariamente formado no contato com os outros "eus", não estou dizendo que Ele não tenha infundido nada no espírito humano, que ele nasça vazio e seja preenchido só pelos costumes de cada povo específico e pela história pessoal de cada um. Deus deu ao ser humano, p.ex., seja ele de que povo for, uma consciência onde gravou os 10 mandamentos (Dt 6,6), por isso a similitude entre as regras básicas das crenças meramente humanas com a Revelação, mas divago, voltemos.

Também não estou afirmando que Deus não aja na vida de cada um dos homens, que não lhes dê a graça individualmente. Naturalmente para que cada pessoa aceite a Palavra de Deus ou para que pratique o bem é imprescindível que esta graça sobrenatural lhe seja disponibilizada de forma pessoal. Estou dizendo somente que: podendo abrir mão de intermediários o Criador optou, misteriosamente, por utilizá-los. Ou seja, Deus revelou que seu jeito de trabalhar inclui a ação missionária do homem, .

Até aqui eu disse, portanto, que: 1) Somos com o outro, que nos faz ser quem somos e com quem nos relacionamos, e; 2) Deus, mesmo podendo, não desejou fugir a esta regra que criou.

Já é permitido, portanto, começar a fazer algumas conclusões: com este “método de trabalho” o Criador já aponta para o valor do ser humano que é, então, "não só" diretamente responsável pela formação das identidades uns dos outros mas digno de, de certa forma, ser "embaixador" de Deus. Mas creio poder ainda mais longe, sobretudo tendo em mente a Revelação. Ao escolher uns e não outros para esta ou aquela tarefa, levando em consideração as características pessoais, o Senhor Deus sublinha ainda mais a diferenciação essencial entre cada uma das pessoas, desigualdade que faz de cada ser humano uma pessoa única, insubstituível e necessária, por isto mesmo infinitamente valiosa, amada por Deus e também por cada um de nós (Mc 12,31 e correspondentes).

Mas me permita ir ainda um pouco mais longe no âmbito da fé cristã.


A própria Boa Nova, por vontade divina, deve ser transmitida de homem a homem. Foi a uns poucos que Nosso Senhor escolheu mostrar-se por completo e a estes deu a missão e a autoridade de ensinar, em seu Nome, aos outros homens (Jo 20,21; Lc 10,3; 2Cor 10,8 ). Como vimos, negar isto equivaleria a dizer que Deus se revela pessoalmente a cada um de nós, o que eliminaria inclusive a necessidade de uma Bíblia e entraria em contradição com aquele "método de trabalho" que indiquei acima. Por esta razão, enquanto um dos apóstolos, ou um dos seus sucessores ou emissários, não chega ao encontro de uma pessoa esta não conhecerá Jesus e, inclusive, não poderá ser culpada desse desconhecimento. Assim foi nos primórdios e é assim até hoje. Se os apóstolos permanecessem trancados no Cenáculo após o acontecimento de Pentecostes o mundo jamais teria conhecido o cristianismo, ou, se seu pai, sua mãe ou qualquer outra pessoa não houvesse lhe contado (ou escrito) sobre Jesus você também não o conheceria.

Isto, porém, causa um grande problema. Se, como vimos, a Boa Nova é transmitida por uma pessoa diretamente a outra, caso o portador deturpe a palavra que recebeu ou lhe acrescente algo o destinatário estará recebendo uma coisa diversa daquela que foi ensinada.

Os primeiros cristãos (principalmente os apóstolos), evidentemente conscientes desse problema, desde muito cedo, quando passaram a escrever uns aos outros, com bastante ênfase exortavam a guarda e a permanência na fé verdadeira que os apóstolos tinham transmitido oralmente ou por carta (2Tes 2,15, 1Cor 11,2; 2Tim 1,13-14).

Com efeito, a comunicação escrita poderia atingir mais facilmente um número maior de pessoas e guardar com segurança parte importante do que Jesus havia ensinado, porém, sozinha aumenta sobremaneira um outro problema, o da interpretação.


Se em uma ponta, a do escritor, se pretende transmitir, com a autoridade que lhe foi dada, a Verdade que lhe foi Revelada, na outra temos o leitor que recebe os signos e os decifra, retirando deles uma mensagem. Entretanto, essa interpretação será influenciada pelas tradições que o próprio leitor recebeu antes de lê-la. Como, então, garantir que a mesma mensagem que se quis transmitir será recebida na outra ponta?

Para aclarar um pouco mais o problema que surge no momento da interpretação volto um pouco naquilo que até aqui tenho tratado. Se, como disse, toda pessoa é um ser-com-os-outros, sempre que ela for buscar o sentido daquilo que está escrito ela se valerá daquela carga que recebeu durante sua vida, do pai, da mãe, do professor, do líder religioso, da cultura na qual está inserido, etc. Isto fica bastante claro quando vemos a interpretação contraditória que católicos, protestantes (e só aqui temos milhares disputando entre si) e espíritas podem dar a um mesmo texto, ou como pessoas de diversas épocas podem entender o alcance da palavra "amor".


Essas tradições não nascem da leitura da Bíblia, mas necessariamente a antecedem (tanto na história da cristandade quanto na vida pessoal de cada um). A rigor o sujeito nem leria a Bíblia se não tivesse nascido em família cristã ou em algum ponto de sua vida esse encontro não lhe fosse oportunizado e querido. Se o leitor deixar um pouco de lado a teoria e pensar na vida concreta facilmente perceberá que, no seu próprio caso, as leituras que faz são sempre influenciadas por uma bagagem anterior, mesmo que depois algumas possam nem ser decisivas na conclusão.

O problema é que no caso das Sagradas Escrituras a mensagem emitida deve ser a mesmíssima captada, já que sendo uma só Revelação, uma a via para a salvação, uma só a Verdade e um só Deus, qualquer erro, por mínimo que seja, levará à um caminho diverso daquele que é o Cristo e, consequentemente, à perdição. Não a toa as Escrituras Sagradas salientam em várias oportunidades uma grande preocupação com a interpretação do que foi escrito, seja negativamente, dizendo claramente que os tolos as deturpam para a própria perdição e que nenhuma das profecias são de interpretação pessoal (2Pe 3,16; 2Pe 1,20), seja positivamente, exortando, como mostrei acima, que permaneçamos fiéis ao que foi ensinado, inclusive oralmente.

Do que foi dito se segue obrigatoriamente que entre todas as tradições que antecedem e devem guiar a leitura e a interpretação dos textos sagrados apenas uma é A correta, apenas uma é compatível com a mensagem original, e é nela que a leitura deve estar imersa. E aqui surge um novo problema: como saber qual é essa Tradição?

Seguindo ainda a lógica de que Deus se utiliza de homens para espalhar a Boa Nova e sabendo que Nosso Senhor primeiramente escolheu e deu autoridade a doze pessoas para falar em seu nome (Mc 16,15), fica evidente que a Tradição em que todo texto sagrado deve ser lido é aquela dos Apóstolos, que, de uma forma ou de outra, tem que ter perdurado até os nossos dias, ou, como vimos, os cristãos apenas acidentalmente esbarrariam na Verdade transmitida por Jesus.

O problema passa a ser, então, identificar onde esta Tradição se encontra, e mais uma vez recorremos à lógica do plano divino. Da mesma forma que Nosso Senhor deu autoridade aos doze (juntamente com São Paulo, diretamente escolhido por Nosso Senhor, mas que, ainda assim, vai ter com São Pedro - Gal 1,18) a falar e agir em seu nome, estes escolheram, prepararam e autorizaram outras pessoas para fazer o mesmo, repassando a autoridade que receberam do próprio Mestre. Estes novos apóstolos, por sua vez, devem ter feito o mesmo ou a autoridade de falar em nome de Nosso Senhor se perdeu e com ela toda a oportunidade de o seguir com a certeza de que se está no Caminho, na Verdade e na Vida.

Felizmente os testemunhos dos primeiros cristãos várias vezes tratam do perpetuamento dessa autoridade, como é o caso de São Clemente Romano (séc. I, terceiro bispo de Roma), que diz em sua carta aos Coríntios:

"Nossos apóstolos conheciam, da parte do Senhor Jesus Cristo, que haveria disputas por causa da função episcopal. Por esse motivo, prevendo exatamente o futuro, instituíram aqueles de quem falávamos antes [bispos e diáconos], e ordenaram que, por ocasião da morte desses, outros homens provados lhes sucedessem no ministério" (44,1-2)

Santo Inácio de Antioquia (final do séc. I, início do séc.II), terceiro bispo depois de Pedro na Igreja de Antioquia, em suas diversas cartas, p.ex., exortava as comunidades pelas quais passava, preso a caminho do martírio em Roma, para que obedecessem seus respectivos bispos e escreve entre outras coisas:

"Ela [a Igreja em Filadélfia, à qual dirige esta carta] é minha alegria eterna e duradoura, sobretudo se os seus fiéis permanecerem unidos com o bispo, com os presbíteros e os diáconos que estão com ele, estabelecidos conforme o pensamento de Jesus Cristo, o qual, segundo sua própria vontade, os fortificou e confirmou com o seu Espírito Santo." (Carta aos Filadelfienses, saudação)

Por estes e outros testemunhos vê-se claramente que há, de Nosso Senhor aos apóstolos, destes aos seus sucessores, destes aos seus e assim por diante, uma linha ininterrupta que liga a autoridade de um bispo de nossos dias (evidentemente aquele que a recebeu de um sucessor legítimo de um apóstolo, nunca alguém que tenha resolvido usurpar esse título sem contudo tê-la recebido) àquela dos apóstolos. Portanto, só imersa na Tradição viva que guardam estes bispos e só na autoridade que têm para ensinar é que a interpretação daquilo que está escrito nas Sagradas Escrituras alcança com certeza sua significação original.

Tal fato fica ainda mais evidente com a lembrança de que mesmo as Sagradas Escrituras tiveram sua formação devida tanto à Tradição quanto à autoridade do Bispo, o que só ocorreu definitivamente no século IV.


Creio ter demonstrado até aqui que Deus se serviu dos homens para transmitir sua boa nova, e, usando desta mesma lógica, quis depender deles para que garantissem a completude e a Verdade do que é ensinado. Não faz sentido imaginar que Deus tenha querido usar dos homens para ensinar e produzir escritos, depois usá-los novamente para selecionar, entre tantos, aqueles que eram inspirados, mais tarde usá-los para copiar à mão e levar ao maior número de lugares possível, sem falar em utilizá-los para ler, para si e para outros, para, então, no momento da interpretação iluminar cada leitor individual e infalivelmente sobre a verdade ali contida. Se fosse para quebrar, aqui, sua própria regra, seria muitíssimo mais simples soprar a Verdade no ouvido de cada uma das pessoas, não haveria necessidade de apóstolos e de Bíblia Sagrada, mas este, como já disse, não é o método de trabalho de Deus, que criou o homem para ser-com-os-outros e se mantém fiel ao que criou.

Acabo aqui a segunda parte desse meu artigo. A seguir tentarei lançar um olhar sobre o papel do "outro" na vida cotidiana da Igreja. Rezem por mim. ;-)


"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

quinta-feira, 5 de junho de 2008

O Outro - Parte I - 2ed.

Prefácio da segunda edição:

Como promessa é dívida e, além do mais, não poderia deixar que pensassem que o tio aqui ficou maluco, segue o texto revisado do artigo sobre a alteridade.

Já havia dito ontem, e repito hoje para os preguiçosos, esta é só a primeira parte mas ainda esta semana, no mais tardar na próxima, publicarei também a segunda. Fiquem de olho, critiquem e opinem.

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O Outro - Parte I

Foi debatendo com uma pessoa que me surgiu a idéia de escrever um pouco mais detalhadamente sobre uma questão que, ao que me pareceu, não estava muito clara para ele e talvez também para muitas pessoas. Trata-se do “outro”, ou da alteridade, ou do próximo, como preferirem, do seu papel em nossas vidas e das suas implicações na religião cristã.

Este é, portanto, meu objetivo aqui. Obviamente o tema é muito abrangente e, por isso, só tenho pretensão de tocar apenas pontos principais, para detalhar a importância das outras pessoas em nossas vidas e, a partir daí, analisar a importância delas no cristianismo.

O que vou dizer corre o grande risco de parecer óbvio demais pois são experiências pelas quais todos nós passamos. Por este motivo peço um pouco de paciência.

Não há pessoa no mundo que nunca tenha tido contato com uma outra pessoa. Desde a nossa concepção já somos com o outro. Ainda nem saímos da barriga das mamães e já dependemos e nos relacionamos com elas, criando inclusive um vínculo afetivo. Nem sabemos o que está acontecendo, nem pensamos nisso, enfim, nem nos conhecemos e já conhecemos o outro, nossas mães.

Tiram-nos do aconchego do seio materno e, junto com o primeiro contato com o externo, temos imediatamente o encontro com várias outras pessoas. Em diversas ocasiões até a respiração é iniciada com a palmada aplicada pelo outro, médico, e, mesmo sem entender nada, mesmo com tanta novidade, nos acalma o cheiro e a voz do outro, mamãe. Antes mesmo de conhecermos o mundo exterior conhecemos e nos relacionamos com o outro.

Essa presença, que nos concebeu e nos persegue desde então, jamais sairá de nossas vidas, mesmo que o exercício da liberdade nos leve ao isolamento em uma montanha. É através de pessoas que temos acesso à linguagem, aos comportamentos sociais, aos conhecimentos acumulados e à religião. É com elas que nos comunicamos e praticamos a caridade, por causa delas podemos avançar sem precisar começar do zero.

Por tudo isto podemos dizer que, em certo sentido, somos mais do que nós mesmos, somos nós mais os outros. Ortega y Gasset dirá que eu sou eu mais minhas circunstâncias, ou seja, cada pessoa é ela própria, seu físico, suas capacidades, seus dons, sua consciência, mas também aquilo que ela viveu, a educação que recebeu de sua família, as coisas que aprendeu, os resquícios dos relacionamentos que teve com certas pessoas, a cultura de sua sociedade e as religiões com as quais teve contato, etc. Todas essas coisas forjam a própria identidade de uma pessoa.

Como já disse mais acima, tudo isto é evidente. Tanto que a sabedoria popular já transformou em dito: “Dize-me com quem andas e te direi quem és”.

De fato, quando alguém lhe pergunta quem é você a resposta mais comum levará, além de aspectos físicos e aptidões, à explicação das escolhas que você fez diante das opções que lhe foram dadas e sua relação com outras pessoas. José, católico, programador, casado com Maria, com duas filhas, Ana e Teresa, filho de João e Cecília, etc... Se esta mesma pessoa tivesse nascido em uma cidade no interior do Iraque certamente as respostas seriam diferentes. Ele não poderá ser católico (ao menos não visivelmente) se em sua vida jamais alguém lhe houver apresentado a Igreja e o batizado, e também não poderá ser programador se alguma pessoa não lhe tiver ensinado o ofício. O fato de não ser nenhuma dessas duas coisas não pode sequer ser considerado como exercício de sua liberdade uma vez que é impossível a escolha do que não se conhece. Mesmo seu nome certamente não seria José mas mais provavelmente Mohamed qualquer coisa.

Essa condição humana é tão inescapável que, ainda que uma pessoa opte por ser revolucionária e deseje subverter todos ensinamentos recebidos, ela estará, necessariamente, fazendo-o a partir de oportunidades e pensamentos vindos de outras pessoas e contra aquilo que ela recebeu antes, agindo, ainda que negativamente, desde onde foi colocado por outras pessoas. Neste sentido nem Descartes e nem Marx, p.ex, são pensadores originários mas desenvolveram seus pensamentos à partir daquilo que já haviam recebido, da educação ao pensamento de outros filósofos.

Neste ponto já é possível perceber como é ridícula a tentativa de reforçar a individualidade pretendendo negar toda tradição recebida. Mudar o nome, revoltar-se contra a sociedade ou a família, recusar obediência às normas morais. Nenhuma dessas atitudes modifica o fato de que, ainda assim, o sujeito continuará um eu + circunstâncias, um eu + outros, eu + tradição.

Da mesma forma, tão claro quanto à participação do outro na formação da nossa identidade pessoal é o fato de que a presença desta alteridade nos afeta diariamente, motivando muitas das nossas decisões, exigindo nossa atenção e, muitas vezes até, modificando profundamente nossas pequenas lógicas, ou melhor, nos obrigando a colocar o pé no chão. Somos um eu+relações-passadas-com-os-outros, mas também somos com o outro, constantemente.

Gustavo Corção, no seu “Descoberta do Outro”, narra o seu processo de conversão do ateísmo materialista para o Cristo e, lá pelas tantas, descreve um acontecimento essencial para a negação do seu materialismo histórico:

“Mas no dia seguinte recomeçava a história. Voltávamos a vociferar e discutir com o Manifesto na mão. Insensivelmente íamos aumentando a solidez do grupo por afeição, pelo brio, pelas palavras dadas, mas julgávamos que era a solidez da doutrina que nos unia melhor. Insensivelmente seríamos levados a praticar imprudências decisivas, gestos sem recuo possível, mesmo porque os agentes ativos da revolução já rondavam nossa porta para colher nossos entusiasmos. As conversas já saíam das divagações e resvalavam para conseqüências práticas. Poucos dias mais e eu me alistaria, com materialismo histórico ou sem ele, pela irresistível força do grupo, numa célula comunista.

Ora, foi nessa ocasião que minha mulher morreu.

***

Morreu moça. Levou dois meses a morrer. E passei esse tempo curvado sobre o meu caso particular. Alguém me dissera que aquela toxemia gravídica, com os progressos da medicina, conta somente um e meio por cento de casos fatais. Passei dois meses quase sem dormir por causa desse um e meio por cento, dando-lhe água e comida como às criancinhas, cuidando das menores coisas, passando um dia feliz por causa de um defecar e logo outro acabrunhado porque o pulso subia. Vi o médico deixar cair o estetoscópio em cima da cama e ficar olhando pela janela, pensativo. Quando me aproximei ele disse:

- Bonito flamboyant!

Olhei também; era no vizinho em frente. Era bonito mesmo. Num dos galhos mais altos estava um passarinho. Lembrei-me de minha cartilha que na segunda ou terceira página dizia assim: ‘O viúvo viu a ave’. Durante algum tempo fiquei remoendo estupidamente esse fenômeno lingüístico pelo qual eu seria um viúvo. Achei esquisito e repulsivo o vocábulo. O médico então me explicou, com termos caridosos, que o meu caso particular estava entrando devagarzinho naquele um e meio por cento, e pondo a mão no meu braço, de leve, com cerimônia, falou-me em Deus.

Viveu ainda uns vinte dias. Uma tarde fui para o quintal e sentei-me num banco, embrutecido. Olhei o Sol que se deitava por trás da casa do coronel. Lá ia o Sol. O Sol era um milhão e quatrocentas mil vezes maior do que a Terra; a Terra, com seus quintilhões de toneladas, era um grão de poeira perdido dentro duma enorme galáxia... Acordei de meus cálculos astronômicos pensando na minha doente desenganada. Era um caso particular, um ínfimo caso particular metido no universo e no tempo. Pensei no materialismo histórico; e senti de repente um calor de vexame no rosto. Olhei em volta com receio que me tivessem visto o pensamento. Senti, como ainda hoje quando me lembro, um vexame intenso. Haverá decerto coisas mais graves, ações muito mais sérias, de piores conseqüências, mas não há nada mais persistente do que a lembrança de uma gafe. Tudo aquilo, as discussões, os sistemas, tinha sido uma gafe. Eu bem sabia, ali sentado no banco, que voltaria depois ao meu trabalho e à vida de cada dia; que sentiria menos à medida que o tempo passasse, que tornaria a fazer meus aparelhos e ler meu galvanômetro. Mas de uma coisa estava certo: o materialismo histórico e a grande raça branca nunca mais teriam sentido para mim. A unidade de minha casa se restabelecia a preço alto, e o sobrado levava a melhor. Olhei para o sobrado, para as janelas do sobrado, e logo o Sol, com todos os seus milhões de vezes, pareceu-me pequeno, e com todo o seu luxo de elétrons e de fótons pareceu-me ridículo diante daquela persiana fechada.

Veio o padre. O franciscano que tantas vezes nos visitara por causa do órgão. O órgão estava embaixo, na sala da frente; e por causa dos seus fios, dos osciladores, de cada peça que durante anos estudara, o padre franciscano estava em cima, no sobrado, tirando dos panos de seu hábito um pedacinho de pão. E foi assim que o Corpo de Deus entrou pela primeira vez sob o meu teto, e que eu assisti, louvado seja Nosso Senhor, ao milagre de uma boa morte. Porque ela riu no seu último dia!” (A Descoberta do Outro, Agir, 10ª. Edição, p. 22-24)

Foi o amor à esposa, àquela pessoa concreta, de carne e osso, que jazia sobre uma cama que o despertou de uma fantasia coletivista, abstrata, na qual, inclusive, a morte de algumas pessoas durante o processo seria inevitável, o que sequer lhe causava remorso ou asco. Foi salvo Graças a Deus e através do outro, o que, infelizmente, não aconteceu com Lênin, Stálin, Mao ou Fidel, deixando um saldo de centenas de milhões de mortos.

Encerro aqui a primeira parte, na próxima oportunidade pretendo passar à análise das implicações disto no cristianismo.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

quarta-feira, 4 de junho de 2008

A volta dos que não foram.

Mês novo vida nova. Embora o tema corrente no final do mês passado (células-tronco embrionárias) ainda esteja dando o que falar pela blogosfera e o resultado do julgamento ainda aperte o coração, resolvi voltar um pouco às origens.

Os dois ou três leitores que me acompanham talvez se lembrem de que certa feita eu escrevi alguma coisa sobre a alteridade (ou o outro, o próximo, como queiram), foi o terceiro post desse blog e, já no título, prometia continuação.

O tempo passou, passou, passou... e a continuação nunca chegou. A bem da verdade ela foi feita, mas altera daqui, altera de lá, acabou nunca sendo publicada. O resultado é que, provavelmente, daqueles dois ou três corajosos se algum se lembra que existe tal texto não lembra o que ele dizia.

Mas nem tudo está perdido, com este post acabo de me obrigar disponibilizar a segunda parte ainda este mês. Antes, porém, vou fazer a primeira re-edição corrigida de um post desse blog, para que refresquem suas memórias. Hoje??? Não, amanhã, ainda tenho que fazer algunas correções ;-p.

Para que este post então??? Propaganda é a alma do negócio. :-) No mínimo, no mínimo fica no ar a dúvida se o blogueiro endoideceu e isto costuma dar ibope.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"