quarta-feira, 10 de março de 2010

Desdobramentos

Frutos da abertura dada pelo Santo Padre com a Anglicanorum Coetibus:

- na Austrália 16 paróquias anglicanas devem se converter em massa;

- nos EUA acaba de ser anunciado que 100 paróquias anglicanas também se converteram;

- na Inglaterra é esperada a conversão de 200 congregações anglicanas nos próximos meses.


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"Tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

terça-feira, 2 de março de 2010

Transforma-se o amador na cousa amada

Lá pelo longínqüo 2008 eu trazia Camões para o blog, em um soneto que começava assim:

Transforma-se o amador na cousa amada,
Por virtude do muito imaginar;
Não tenho, logo, mais que desejar,
Pois em mim tenho a parte desejada.

Agora, já em 2010 eu leio em São João da Cruz:

"Para dar mais evidência a esta doutrina, observemos que o afeto e o apego da alma à criatura a torna semelhante a esta mesma criatura. Quanto maior a afeição, maior a identidade e semelhança, porque é próprio do amor fazer o que ama semelhante ao amado."
(in Subida do Monte Carmelo, Livro I, capítulo IV, parágrafo 3).

Premissas idênticas, conclusões diferentes.

Em Camões o amante já nem precisa mais da amada, pois tem em si a parte desejada, se sente cheio, quase em um narcisismo disfarçado.

Em São João da Cruz o amante é diminuído por essa afeição. Ele diz mais a frente:"assim, o que ama a criatura desce ao mesmo nível que ela, e desce, de algum modo, ainda mais baixo, porque o amor não somente iguala, mas ainda submete o amante ao objeto do seu amor".

Para o Santo, portanto, todo amor, qualquer que seja ele (ao dinheiro, à comida, a um amigo, etc.) deve antes passar por Deus. Deve, então, ser amor através de Deus, através da Verdade, através do Bem. Só assim não somos diminuídos, não somos escravizados, não somos, enfim, tomados por falsas alegrias.

Quantas vezes nós amamos errado? Quantas vezes nos "transformamos" em outra criatura e somos por ela diminuídos e escravizados? Quantas vezes a criatura que amamos é nosso próprio umbigo e acabamos cheios de si, em um círculo vicioso infernal?

A quaresma é O tempo para revertermos essa situação: Evitando a vanglória, dando, pela oração, glória a Deus; Educando nosso amor ao desapego, através do jejum e da abstinência; e cultivando o hábito de amar através de Deus, pela caridade.

Precisamos desta via purgativa, desta purificação da alma, para crescermos, para deixarmos, ao menos em parte, a escravidão e as angústias e lágrimas que a acompanham. Sem isso viveremos na falsa esperança de um dia sermos felizes em nosso próprio mundo de fantasias, como o de Camões, que completa:

Se nela está minha alma transformada,
Que mais deseja o corpo de alcançar?
Em si somente pode descansar,
Pois com ele tal alma está liada.

Nunca vi isso funcionar, mas se você está disposto a tentar, vai lá amigão... mas não diga que eu, ou melhor São joão da Cruz, não avisou.



"tuu totus ego sum, et omnia mea tua sunt"

Subida do Monte Carmelo

Depois de umas reflexões mais políticas, e aproveitando a Quaresma, uma palavrinha de São João da Cruz:

"Oh! quem pudera fazer compreender, amar e praticar tudo o que encerra este conselho dado pelo Salvador sobre a renúncia de si mesmo ["se alguém me quer seguir, negue-se a si mesmo, e tome a sua cruz e siga-me, porque quem quiser salvar sua vida, perdê-la-á; mas quem perder a sua vida por amor de mim, salvá-la-á" (Mc 8,34-35)], para os espirituais aprenderem como devem andar neste caminho de modo bem diferente do que muitos pensam! Segundo a opinião de alguns é suficiente reformar os hábitos e ter um pouco de retiro; outros se contentam em praticar até certo ponto as virtudes, orar e mortificar-se. Mas nem uns nem outros se dão ao verdadeiro desprendimento e pobreza, à renúncia e pureza espiritual (que é tudo o mesmo) aconselhada aqui pelo Senhor. Bem longe disso, vivem a alimentar e encher a natureza de consolações e sentimentos espirituais em vez de desapegá-la e negar-lhe toda satisfação por amor de Deus. Pensam ser bastante mortificá-la nas coisas do mundo, e não querem aniquilá-la completamente e purificá-la em toda propriedade espiritual. Assim fogem eles como da morte à prática desta sólida e perfeita virtude que está na renúncia de todas as suavidades em Deus, e que abraça toda a aridez, desgosto, trabalho, numa palavra, a cruz puramente espiritual e o despojamento completo na pobreza de Cristo. Buscam somente as suaves comunicações e doçuras divinas. Isto, porém, não é a negação de si mesmos, nem desnudez de espírito, mas, sim, gula de espírito. Essas pessoas se tornam espiritualmente inimigas da cruz de Cristo, pois o verdadeiro espírito antes procura em Deus a amargura que as delícias, prefere o sofrimento à consolação; a privação, por Deus, de todo o bem ao gozo; a aridez e as aflições às doces comunicações do céu, sabendo que isto é seguir a Cristo e renunciar-se. Agir diferentemente é procurar-se a si mesmo em Deus, o que é muito contrário ao amor. Com efeito, buscar-se a si mesmo em Deus é procurar as mercês e consolações divinas; mas buscar puramente a Deus consiste não só em querer privar-se de todos os regalos por ele, como ainda em inclinar-se a escolher, por amor de Cristo, tudo quanto há de mais áspero, seja no serviço divino, seja nas coisas do mundo: isto, sim, é amor de Deus."
(São João da Cruz, Subida do Monte Carmelo, livro II, capítulo VII, parágrafo 5)



"Tuus totus ego sum, et omnia mea tua sunt"